A obesidade é uma condição crônica, multifatorial e de difícil controle, que afeta mais de 650 milhões de pessoas em todo o mundo. Além de comprometer a qualidade de vida, ela está associada a uma série de complicações metabólicas, como diabetes tipo 2, hipertensão, dislipidemia, doenças cardiovasculares e hepáticas, além de maior risco para alguns tipos de câncer.
Nos últimos anos, medicamentos agonistas do receptor de GLP-1 (peptídeo semelhante ao glucagon tipo 1), como o semaglutida, transformaram o tratamento da obesidade. No entanto, uma parte significativa dos pacientes não alcança metas satisfatórias de perda de peso ou apresenta intolerância gastrointestinal.
Nesse contexto, surge a tirzepatida, um agonista duplo dos receptores GLP-1 e GIP (peptídeo insulinotrópico dependente de glicose), que promete resultados superiores e um novo paradigma no tratamento farmacológico da obesidade.
Artigo referência: Full article: Tirzepatide for overweight and obesity management
O que é a tirzepatida e como ela atua
A tirzepatida é uma molécula de aplicação semanal que combina a ação de dois hormônios intestinais fundamentais para o metabolismo energético: o GLP-1 e o GIP.
Enquanto o GLP-1 promove saciedade, retarda o esvaziamento gástrico e reduz a ingestão alimentar, o GIP estimula a secreção de insulina, melhora a sensibilidade à insulina no tecido adiposo e pode reduzir a náusea.
Essa dupla ação potencializa os efeitos sobre a perda de peso e o controle glicêmico, levando a reduções mais expressivas de gordura corporal. Estudos pré-clínicos mostraram que o uso combinado dos dois agonistas proporciona perda de peso superior à administração isolada de cada um deles.
Evidências clínicas: o programa SURMOUNT
O programa SURMOUNT, composto por ensaios clínicos de fase 3, investigou de forma abrangente a eficácia e segurança da tirzepatida no manejo crônico do peso corporal. No estudo SURMOUNT-1, indivíduos com sobrepeso ou obesidade, mas sem diabetes tipo 2, apresentaram uma redução média de peso entre 16% e 22,5% com as doses de 5, 10 e 15 mg de tirzepatida, efeito que se manteve de forma consistente ao longo de três anos de acompanhamento.
Nos ensaios SURMOUNT-3 e SURMOUNT-4, em que se utilizou a dose máxima tolerada, observou-se uma perda média de 26% a 26,6% do peso corporal, em comparação a apenas 3,8% a 9,5% nos grupos placebo. Já o SURMOUNT-2, que incluiu pacientes com diabetes tipo 2, demonstrou uma redução de até 15,7% do peso médio com as doses de 10 e 15 mg, frente a 3,3% no grupo controle.
Além da perda ponderal, o medicamento promoveu melhora significativa em parâmetros metabólicos:
- Redução da circunferência da cintura (até –20 cm);
- Queda da pressão arterial sistólica e diastólica;
- Melhora do perfil lipídico, especialmente dos triglicerídeos;
- Conversão de prediabetes em normoglicemia em mais de 90% dos participantes.
Em indivíduos com pré-diabetes, a tirzepatida reduziu em 93% o risco de progressão para diabetes tipo 2.
Tirzepatida e complicações associadas à obesidade
A ação da tirzepatida vai além da perda de peso. Estudos recentes apontam benefícios clínicos expressivos em condições relacionadas à obesidade:
- Apneia obstrutiva do sono (SURMOUNT-OSA): redução no índice de apneia-hipopneia;
- Esteato-hepatite associada à disfunção metabólica (SYNERGY-NASH): resolução da inflamação hepática em até 62% dos casos sem piora da fibrose;
- Insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (SUMMIT): redução de desfechos de insuficiência cardíaca e melhora significativa dos sintomas.
Esses resultados indicam que a tirzepatida pode se tornar uma terapia de primeira linha não apenas para controle de peso, mas também para prevenção e manejo de complicações cardiometabólicas.
Perfil de segurança e tolerabilidade
Os estudos do programa SURMOUNT mostraram que a tirzepatida é geralmente bem tolerada.
Os efeitos adversos mais comuns foram náusea, diarreia, constipação e dor abdominal, semelhantes aos observados com os agonistas de GLP-1, e geralmente de intensidade leve a moderada.
Casos de pancreatite e doença da vesícula biliar foram raros, e não houve aumento na incidência de neoplasias.
Importante destacar que não foram observados casos de hipoglicemia severa, exceto em pacientes que faziam uso concomitante de sulfonilureias ou insulina.
Considerações práticas e perspectivas futuras
Com base nas evidências atuais, a tirzepatida representa uma revolução terapêutica no manejo da obesidade. A magnitude da perda de peso obtida, aproxima-se dos resultados de cirurgia bariátrica, com a vantagem de ser um tratamento farmacológico de aplicação semanal.
Além disso, a melhora em marcadores metabólicos, cardiovasculares e hepáticos reforça o potencial do medicamento para reduzir o risco de mortalidade e morbidade associadas à obesidade.
Entretanto, ainda são necessários dados de segurança cardiovascular a longo prazo (como os aguardados no estudo SURPASS-CVOT) e análises de custo-efetividade para incorporar a tirzepatida de forma ampla em políticas públicas de saúde.
Conclusão
A tirzepatida inaugura uma nova era no tratamento da obesidade e do sobrepeso. Seu perfil farmacológico único, aliado a uma eficácia superior e a benefícios cardiometabólicos consistentes, coloca o medicamento como um dos agentes mais promissores da nutrologia moderna.
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